A Crença no Mundo Justo

Alessandro Bender
4 min readAug 21, 2019

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Uma importante área de pesquisa, ainda pouco explorada.

Existem características interessantes de nosso comportamento que nos fazem culpar as vítimas pelos suas problemas

Já ouviu alguém falando sobre pessoas pobres ou necessitadas? Que elas não se esforçam para sair de sua situação? Eu já vi um monte de gente falando a seguinte frase: É um homem forte, com saúde, podia muito bem estar ganhando dinheiro justamente ao invés de sair pedindo por aí.

O que a Teoria da Crença no Mundo Justo diz é que tendemos a associar Comportamento à Resultados (o que chamamos comumente de Meritocracia). Se nosso comportamento for adequado, os resultados virão.

Melvin J. Lemer

Quem criou este conceito foi Melvin Lemer, em 1960. Como diz Isabel Falcão Correia em seu artigo de "A teoria da crença no mundo justo e a vitimização secundária: Estudos empíricos e desenvolvimentos teóricos":

Os mecanismos subjacentes à formação da crença no mundo justo

Lemer (1971a) considera que a CMJ se desenvolve quando a criança deixa de viver pelo “princípio do prazer” para passar a viver de acordo com o “princípio da realidade”. Este princípio leva a que a criança seja capaz de desistir de uma recompensa imediata para obter uma recompensa superior num momento posterior. Quando o faz está a acreditar que o mundo é justo, na medida em que os seus custos e investimentos se traduzirão no resultado esperado. Assim, a criança acredita que, se merecer o que pretende, de certeza que o obterá. Consequentemente, segundo a teoria da CMJ, é a crença no mundo justo que está subjacente ao desenvolvimento do “contrato pessoal” (Lemer, 1971a), através do qual as pessoas planeiam as suas acções de acordo com o princípio do merecimento, isto é, fazem investimentos e têm custos para passarem a merecer o que desejam e assim terem mais probabilidade de o obter. O sentimento de que se tem direito a algo (entitled to) enquanto resultado do merecimento é, segundo Lemer (1987), sentido como um imperativo. Quando as expectativas do sujeito são goradas surgem fortes reacções emocionais associadas à injustiça, como a raiva.

Assim, a CMJ assume uma importante função adaptativa. De facto, alguns estudos mostraram que, quando as pessoas se sentem impotentes para afectar o seu próprio destino, ocorre uma deterioração da integridade física e emocional do organismo (Seligman, 1975; Leftcourt, 1976; Wortman & Brehm, 1975). Leia aqui o artigo original

Para que possamos sair do Princípio de Prazer e passarmos a viver a partir do Princípio de Realidade precisamos aceitar uma crença, ou seja, uma relação de fé

…que ao desistirmos dos prazeres imediatos para obter maiores resultados no futuro, isto realmente acontecerá. Que nada vai acontecer no meio do caminho, que nenhum obstáculo poderá interromper esta lógica, e que há uma Justiça por trás disto.

O interessante é que ao vivenciarmos uma injustiça tendemos a culpar a pessoa injustiçada pelo fato, já que temos internalizado um sentimento de justiça aprendido na infância. O mundo é justo, o que aconteceu é que a pessoa não fez direito o que deveria fazer, daí deu errado para ela.

Por que acreditamos nisto? Porque se não acreditarmos teremos de nos confrontar com a possibilidade de que o mundo venha a não ser justo também conosco . Esperamos que as coisas aconteçam de maneira correta, e preferimos negar que ele é injusto a aceitar que qualquer coisa pode acontecer em nossas vidas.

Como Somos Injustos por Isto?

Por basearmos nossa opinião e julgamento a partir de uma premissa falsa: Que se fizermos tudo direitinho o mundo nos recompensará. Se ele não te recompensou, provavelmente você agiu errado, descumpriu algum trato social.

Deixamos fora desta equação todas as injustiças que esta pessoa possa ter passado ou estar passando, ignoramos que nem sempre a vida é justa (na maioria das vezes é injusta) e acabamos apontando o dedo para a vítima, reforçando ainda mais a injustiça que esta pessoa provavelmente está passando.

Alessandro Bender

www.alessandrobender.com.br

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